“Magnata dos Terceirizados” escancara o novo modelo de gestão pública no Piauí

A Operação Gabinete de Ouro, desencadeada pela Polícia Civil do Piauí nesta terça-feira (14/10), revelou a participação de um empresário identificado como “Magnata dos Terceirizados” no possível esquema de corrupção no âmbito da gestão municipal de Teresina, sob responsabilidade do ex-prefeito Dr. Pessoa.

Enquanto se terceiriza o serviço, também se terceiriza a responsabilidade

Para além de um codinome curioso, a figura desse empresário que supostamente controlava contratos e intermediava pagamentos para fortalecer o esquema de corrupção na Prefeitura de Teresina, a operação também revelou um fenômeno silencioso que vem redesenhando a estrutura administrativa do Piauí, qual seja, o avanço das terceirizações dentro de prefeituras, secretarias e de outros órgãos estaduais.

O que começou como medida emergencial para suprir carência de servidores efetivos, transformou-se em um modelo de gestão permanente, que desloca responsabilidades, fragiliza vínculos e, muitas vezes, abre espaço para contratos de alto custo e baixa transparência.

A situação revelada é tão alarmante que, em vários órgãos e entidades públicas, o número de terceirizados supera o de servidores concursados. Empresas contratadas para serviços gerais, limpeza, vigilância, transporte e até assessoria contábil se multiplicaram. O problema é que, por trás da aparente eficiência administrativa, há um sistema que escapa ao controle público.

Os contratos de terceirização costumam ser volumosos, renovados ano após ano, com cláusulas genéricas e pouca clareza sobre a quantidade de pessoal efetivamente alocado. Em alguns casos, uma única empresa concentra contratos em diferentes secretarias, operando com valores que ultrapassam a própria folha de pagamento dos órgãos contratantes.

Essa estrutura cria uma administração paralela, onde o poder real passa a residir nas mãos de prestadores de serviço, e não de servidores públicos. O gestor assina, mas quem executa é a empresa, e entre uma planilha e outra, se dilui o princípio da impessoalidade que sustenta o serviço público.

A ausência de concursos públicos não é mero acaso. Em muitos casos, é uma escolha política. Manter contratos de terceirização significa manter influência sobre contratações indiretas, com impacto direto na base eleitoral local. Pessoas ligadas a vereadores, secretários e lideranças partidárias acabam sendo absorvidas por empresas terceirizadas, em um ciclo que mistura gestão e conveniência.

O Tribunal de Contas do Estado já identificou irregularidades recorrentes em contratos desse tipo, especialmente em municípios de pequeno porte, onde o controle interno é frágil e a dependência política, intensa. O resultado é a precarização das relações de trabalho, a elevação dos custos e a perda de autonomia técnica da administração pública.

A terceirização, quando bem planejada, pode ser instrumento de eficiência. Mas quando se torna substituta permanente do servidor público, converte-se em um atalho para o clientelismo, permitindo a aparecimento de figuras como o tal “Magnata dos Terceirizados”. O que era exceção virou regra, e o que deveria racionalizar gastos passou a justificar desperdícios.

No Piauí, o avanço desse modelo é um retrato da fragilidade institucional. Enquanto se terceiriza o serviço, também se terceiriza a responsabilidade. E quando o contrato vence, quem fica é o prejuízo, e a certeza de que o poder público se afastou, mais uma vez, daquilo que deveria ser seu papel essencial: servir com autonomia, transparência e mérito.

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